segunda-feira, setembro 03, 2007

Ecos em mim

Com a força que ecoa dentro de mim
Ensurdece-me e abandona-me por fim.

Atira-me do alto, aos confins da memória
Pisa-me
Rasga-me
Estropia-me
Passa-me à história.

Se dia algum me amou sem razão
Beija-me
Toca-me
Acaricia-me
Tortura-me até mais não.

Resta a estaca no meu coração
Aliviado agora da anterior ocupação.
Agora sem ti, já tanto faz,

Diz-se que o antigo já por aí jaz…

sábado, agosto 11, 2007

A fotografia

Apresentou-se-me como alguém que respirava os seus sonhos, e regia a sua vida em função deles. De fácil trato e amoroso para o ambiente em redor, contrastava por vezes com uma revolta face às injustiças que facilmente se encontravam e lhe tocavam na consciência. Um revolucionário romântico. Não é preciso ser-se um génio para facilmente depreendermos que o séc. XXI não se coaduna nem está preparado para receber um “novo” Che Guevara, e não só devido às questões políticas (ou falta delas). Confessou-me certa vez que ostentava uma fotografia do “Comandante” num placar de cortiça na parede do seu quarto.
«-Um homem como nunca mais haverá! – dizia com um brilho nos olhos – Viveu e morreu seguindo os sonhos da igualdade, solidariedade e justiça! Claro que os lordes deste mundo não podiam permitir que ele vivesse…»
Comigo partilhou muitos dos seus sonhos e a forma como os idealizava no escuro do seu quarto enquanto esperava ser abraçado pelo sono e cansaço.
Um dia houve que se dirigiu a mim e, num misto de cabisbaixo com uma revolta prestes a explodir, disse-me que «merda de vida esta, que não me merece». Não havia sido capaz de pôr um dos seus sonhos em prática. Ignorância, medo, receio, palavras repetidas apenas com o intuito de justificar as lágrimas que tinha derramado anteriormente. Nem quero calcular o que teria ele sentido, uma pessoa que, na minha opinião, está mais capaz de derramar o seu próprio sangue do que um punhado de lágrimas. Alguém a quem os sentimentos pregaram uma rasteira e toda a ideia do romantismo revolucionário desabou sobre ele ferindo-o violentamente sem sequer o ter tocado…
Hoje vive agarrado à realidade e parece-me estranhamente feliz, mas consigo próprio, como se vivesse alheio e isolado num local por ele idealizado, tudo na sua mente. Como se tivesse atingido um novo nível espiritual desconhecido dos restantes mortais…
« - Vou agarrar-me ao que tenho e ao que me dá garantias. – argumentava – ao palpável, deixar-me de sonhos que nada de bom me trazem e só me enfraqueceram. Porém não guardo ressentimentos.»
Nunca soube o que raio tinha desmoronado aquela enorme torre. Disse-me apenas que alguém, outrora lhe havia dito «que a vida são dois dias e temos que aproveitar, essa é que é essa!»
Recusei-me a alongar a conversa, pressupus que não levaria a lado nenhum e não o queria castigar mais com o assunto.
Suspeitei do que aconteceu quando vi que uma das fotografias que tinha na parede havia desaparecido. A ignorância, o medo e o receio não deixavam de existir, mas agora, pelo menos, já não eram vistos lado a lado com ele. Quem diria que um dia caminhou lado a lado com o seu demónio? E quem não caminhou já?
A fotografia do “Comandante”, essa, ainda lá está…
Faz-me feliz ver a forma com agora se tornou mais objectivo e de pés assentes na terra. Mas eu sei que lá no fundo, e naquele interior ferido, ainda vai sonhando… Mas sem tanta dor.

Algures em 2007

sábado, agosto 04, 2007

Assentos Hard-Core

Aqui vive-se perdido no espaço e tempo,
No bairro propício a filmes de terror.
Somos todos protagonistas
Bem-vindos! Entraram nos Assentos Hard-Core!

Fecha a menina dos teus olhos em casa!
Fica o aviso ao mais incauto progenitor.
Nas ruas deste bairro
Fode-se sem qualquer pudor.

Noites uma constante animação
Perfumadas pela droga a queimar
Ora são vizinhos que lutam
Ou bebedeiras a cantar

Adultério, crime e demência
Caminham contigo sem veres.
A tua vida transforma-se em novela
Sem sequer te aperceberes

Entra na teia destas boas gentes
Todos querem ajudar
E partilhar com o mundo os teus momentos
Fala o poeta popular:
“Daqui nem bons ventos nem bons casamentos”
Este é bairro dos Assentos…
Assentos..Assentos Hard-Core!


Agosto de 2007
Em homenagem a este grande pardieiro onde vivo!

terça-feira, maio 29, 2007

Primavera sem flores.

As luzes apagam-se, a cortina desce…
O teatro de gelo derrete-se e flúi para destino incerto, deixando actores em lágrimas e espectadores intriguistas em êxtase. Prostramo-nos perante a mentira enquanto ignoramos o desabrochar das flores. Colho as flores e o desgosto, meu e alheio, numa repugnância fértil em castigos dos quais nunca me rendi. Assim vivemos numa harmonia perfeita entre o sofrimento e a miséria. É assim, mais que merecido um aplauso em pé.
Ovacionados pelos nossos assassinos que nos colhem as flores testemunhei o nascimento daquele que não tem pai nem mãe. Aquele que, posteriormente, morreu em teus braços e eu enterrei sem direito a velório. Testemunha na vida e morte do mais querido que já tive oportunidade de não ter. A reanimação foi tua ignorância e terra em cima da caixa torácica onde foi enterrado. Mãe e Morte do fado lindo agastado na monotonia do amor. Madrasta e Vida de momentos paralelos e lentamente agoniados pela não presença daquela timidez carinhosa que tinha toda a importância num mundo que se extinguiu… e nunca foi chorado.
E passou-me a loucura temporária, vivida no fio do horizonte do jardim que disfarça a campa dos meus momentos enganosamente felizes, que subtilmente colheste sem sobreaviso ou intenção de esfaquear.
Nada faz sentido.
Nada foi em vão.
Percebo agora a cor do sangue que se esvai de mim.
Vermelho de paixão que não é…
Vermelho de fogo que se apagou…
Vermelho da flor que o Outono colheu com tuas mãos do meu coração.
Com tuas mãos me acariciaste,
Com tuas mãos (a bela flor) te colheste…
Continuará?

domingo, maio 13, 2007

7 palmos

Nos meus 7 palmos de terra, sou rei e senhor.
Nunca, com tanta cegueira,
Vi tudo com tanta clareza.

Nesta ausência de sentimentos e dor
O sol ilumina-me por uma peneira
Porque sou rei, sou alteza.

Nos meus 7 palmos de terra sou dono da eternidade.
Componho agora diálogos
que, baseados em momentos análogos
São a mais pura da verdade.

Nos meus 7 palmos de terra vivo e espalho o terror.
A meu lado jaz o meu demónio,
Comigo nestes 7 palmos de ódio,
Contigo 7 palmos de amor.

em Fevereiro de 2007

Homenagem

Pergunto-me se me vês aí do alto.
Algures no silêncio escuro sinto que ainda caminhas comigo. Resolves fazer-me companhia enquanto percorro o atalho para te encontrar. És a única alma, no meio de muitas que me acompanham, que me dá a mão para não me perder. Na memória reponho longas conversas e, palavra a palavra, viajo para outros tempos que não me trarás de volta.
Engraçado a forma como agora estou tão próximo de ti. Sinto-te de uma forma tão clara e lúcida que me apercebo que não estás realmente aqui. Deixaste apenas o teu cheiro que, de uma forma imaginária, me mostra que todos os aromas que provei são desprovidos da verdadeira essência…
No outro dia, enquanto chorava, sei que choraste também. Um céu carregado de nuvens brindou-me com as tuas lágrimas com as quais me senti finalmente... Assim nos encharcámos os dois em mágoas e passados distantes.
Neste preciso momento o teu corpo inclina-se sobre o meu para veres o que estou a escrever. Não percebo o que fazes aqui, junto a mim. Num mundo de desilusão e faz-de-conta. Leva-me antes contigo para o teu, aquele que me mostraste outrora, aquele onde tudo é, à tua imagem, lindo. Onde finalmente durmo sem morrer durante a noite, porque junto a ti é a única forma de estar vivo. Como homenagear-te? Lembrar-me-ei SEMPRE.
Eterna saudade de ti.
Para sempre contigo
em Março de 2007

sexta-feira, abril 13, 2007

Origem da minha escrita: "porquês" e "comos"

Algures na vergonha do meu pensamento,
Observei absorto à morte da minha ilusão sem sentido
Ao dizer-me que tudo o que já tenho vivido
Esfuma-se para sempre ao sabor do vento.

Volta o poeta mórbido e embriagado.
Na escrita decomposta e pútrida,
Nunca bela, ordenada e lúcida,
Expõe-se inconformado e revoltado.

Perdido nas cinzas do olhar terno…
Encontrado na baixa-mar do teu horizonte
Desmaiado, caído, nas vergonhas que a preia-mar esconde.
Sou assim, e o que sou é eterno…
…este amor/ódio que me consome é eterno!

Matemática

Poucos podem dizer que conhecem o amor.
Muitos podem dizer que conhecem o ódio.
Poder-se-á dizer que o amor é a antítese do ódio? O lado oposto?
Engraçado como sentimentos que, se pode dizer, não são o amor desencadeiam sentimentos como o ódio!
Mas o mais engraçado é que sentimentos como o ódio nunca geram sentimentos como o amor…
Assim:
O amor muito provavelmente gerará ódio/raiva.
O ódio/raiva nunca gerará amor.
Nesta matemática estranha o ódio é filho do amor. O amor por sua vez é nosso filho, aquele que sempre desejámos e nunca tivemos.
Mas porque escrevo eu isto? Terei amado e agora odeio? Porque nunca soube o que é o amor? Mas eu sei o que é o amor, ele é que não sabe quem eu sou…
Terá o ser humano sido feito para odiar enquanto que para amar é necessário uma construção morosa da parte de engenharias sentimentais?
As duas pessoas que costumam ler o que escrevo pensem nisto e depois digam-me qq coisa, pq eu não percebo…

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Para rir...

Fui-te vendo ao longe, numa rua não sei onde,
Caminhando incólume e graciosa.
Um aspecto distraído num mundo aparentemente perdido
Onde, retraído, só eu te acho famosa.
Apenas eu te acho famosa.

Passo a passo vais-te aproximando, eu ali olhando
Escapando à tua imagem espantosa.
Espanto-me com tamanha elegância, a qual,
Sem dares importância, te põe maravilhosa.
Elegante e maravilhosa.

Agora, cada vez mais perto não podia estar mais certo.
Manténs a indiferença na postura portentosa.
Perante a tua presença aguardo a tua sentença,
Ouço num sussurro a tua voz primorosa.
À tua imagem, primorosa.

Para minha surpresa remetes-te à defesa
Será impressão minha ou deixei-te receosa?
Finalmente vejo-me em frente dela,
Mas vejo-a tão bela e tão medrosa.

Tão bela e tão medrosa.

Fevereiro de 2007

terça-feira, janeiro 16, 2007

Silêncio!

Estranho o teu silêncio
Porém não é estranho para mim.
Diz-me o que eu mais temia,
Que um de nós não resistia
E que este não amor chegou ao fim.

Dizem-me os teus olhos
Aquilo que nunca quis.
Tua riqueza em palavras
Com que me embalavas
Agora nada me diz.

Tudo está perdido.
Fica a mórbida visão
Com a qual ainda tremo.
Mas agora já não temo,
Não vives no meu coração.


Janeiro de 2007

Doloroso despertar

Do sonho acordo.
Nele me perco.
Nele falo muito e nada acerto.

Ardo em lume brando.
Derretem-se-me os sentimentos,
Entrega-me a tormentos.

Vejo-me num pranto.
Finalmente desperto.
Acabam os sonhos,
Começam os pesadelos.


Janeiro de 2007

quinta-feira, janeiro 11, 2007

Mar negro

Dá-se o nascimento do sol…
Perdido entre nuvens e gaivotas a planar,
Que enobrecem a sua visão.
De tanto viver obcecado no desassossego do mar,
Tornou esta paixão num amor platónico em vão.


Acabei por perguntar:
- “Tu, maior força da natureza, que amas neste mar?”
- “Adoro o rebentar das ondas que soam como um trovão,
O esforço dos pescadores expresso por um esgar,
E as mulheres que por eles ali choram e rezam ajoelhadas no chão.”

“Divino sol, vira as costas ao teu coração!
É um engano este amor de encantar.
Escuta-me, pois na minha voz está a razão,

Mesmo que fujas, as ondas continuarão a rebentar."

Janeiro de 2006

quarta-feira, janeiro 03, 2007

Sustos

A luz da tua pele encandeia-me de um jeito carinhoso.
O negro dos teus olhos assusta-me de tão lindo e tenebroso.
Boquiaberto percorro as linhas do teu corpo.
Desorientas-me e fico meio tonto.

Será amor? Será obsessão?
Ou apenas uma partida do meu coração?
Reconheço-te pelo andar e o teu mover.
Olhas-me nos olhos e fico cego só por te ver.

Assim, momento a momento,
Aprecio o teu movimento
Fico ébrio e não sinto nada, abandona-me a dor.
À minha volta tudo é lindo e cor.
Como no sonho em que a tua sombra é azul-turquesa
Onde uma orquídea é esculpida com a tua beleza.

Vivo contigo no meu mundo,
Onde a teu lado deixo o meu ser moribundo e me aqueço no teu calor.
Com um estalar de dedos podes estimular a dor,
Assim me assusta o meu amor…


Janeiro de 2007

terça-feira, novembro 28, 2006

O porquê de não escrever...

Não tenho escrito por uma simples razão. Tenho o coração descascado em fatias pequenas por facas enferrujadas. Está aberto um buraco no meu peito infectado pelo qual os anjos me abandonam voando para outros céus escuros a meu olhar, onde pairam nuvens de sentimentos e fadas de olhos vermelhos em chamas que me estrangulam nesta sala negra. Aqui choram-se lágrimas de sangue.
Lentamente desfaleço e entro no coma induzido pela minha inspiração. As melhoras…
Cravam as presas na minha carne, e eu vejo-a flutuar. São pedaços de mim que te levam daqui. Fico eu e o branco laminado do anoitecer dos meus ossos no lusco-fusco. Brevemente (ou não) a carne será reposta. Pouco a pouco. Trazendo de volta a minha inspiração. Até lá…

quarta-feira, novembro 15, 2006

Auto-retrato (sim, sou eu...)

Sombras aos pedaços que outrora formaram um eu riem desalmadamente. Fragmentos de mim que tento recolher para formar um castelo humano. Aqui não faço nada, por isso volto para o meu mundo de desespero onde finalmente dou liberdade à minha morbidez calada. Remeto-me ao silêncio de quem tem tanto para dizer e ninguém a quem o dizer. Compreenderás a minha alma?
Saudades dos vivos, que não vejo hà muito. Não sinto falta dos meus defuntos, vê-los-ei em breve.
Cada vez que adormeço e acordo no dia seguinte apercebo-me que morri durante a noite, mas apenas um pedaço. E então, pedaço após pedaço, após pedaço… durmo. Acordo descansado da morte e cansado da vida.
Farrapos enxovalhados, do bonito lençol que fui outrora, já não bailam ao vento nem brilham ao sol. Num branco escuro carregado de incertezas, em que a única certeza é a dúvida. A dúvida que nos mantém no trilho deste feliz acaso que é a vida. Vida? E depois da vida? E depois de abandonares a embalagem onde te transportas para todo o lado? Espero-te no meu mundo onde dançaremos no baile de surdos. Onde todos vivem na casa assombrada por Deus e por todos os que o julgaram um dia ser. Foi Deus que me criou. Para gáudio próprio. Amamentou-me e fez-me forte. Cresci. E fez-me assim porque são estas as bestas que dão mais gozo abater. Mas são estas as bestas que mais facilmente se viram contra o dono. Quem terá criado Deus? Amar-nos-á ou nutre por nós um ódio visceral?
Abandonei a cruz que carrego e peguei na espada, com a qual disseco e decomponho em troços pequenos tudo dentro de mim e à minha volta. Observo e vivo amores esquizofrénicos com os quais me regozijo. Partidos aos bocados são mais fáceis de engolir. Assim te parto, assim te degusto.
Sem o peso da cruz parto em busca. Procuro-me a mim. Vasculho-me e não me encontro. Grito por socorro, estou cada vez mais perdido. Encontro-te e perdemo-nos juntos. A miséria adora companhia. E eu adoro-te a ti. Sou a tua miséria e tu a minha companhia. Dá-me a mão e vamos juntos conhecer este abismo lindo onde nunca ninguém ousou entrar. Vamos buscar incertezas e dúvidas que a morte esclarecerá em breve. Tudo é oco e fabricado em vão. Em vão vives, fragilmente e docemente, uma vida dura e amarga. Eu não vivo em vão. Tenho uma missão que me foi endossada que ainda estou para descobrir qual é. Senão porque outra razão aqui estaria? Vivendo vaziamente? Há algo aí por fora que me espera senão já teria ido embora há muito tempo. Nem que seja salvar o mundo de mim próprio. E quem me salva a mim de mim próprio? Estarei condenado a esta agonia de viver para sempre comigo? Uma vida de incerteza, de vazio, de ideias levadas na brisa que um dia me atravessou e me esventrou de um sentido claro e pertinente para mim próprio? Brisas vão, brisas vêm. Há-de chegar a brisa que me encha novamente. Já avisto o pó que levanta, ao fundo, no ar. Depois de experimentar a sensação de sufocar ou de ser enterrado vivo por esta tempestade sei que finalmente saberei o ando aqui a fazer, e qual o teu papel no meio disto tudo. Até lá morremos juntos, pedaço após pedaço, após pedaço… até que algo nos separe!

Novembro de 2006

quarta-feira, novembro 08, 2006

Cinzas e pó

Devolvo-me ao sítio de onde vim.
Devolvo-me às cinzas e pó. Sou apenas cinzas e pó.
Arde uma vela que tenta iluminar o cinzento da alma e tudo em redor.
Ao redor de mim, ao redor de ti.
Tudo é pó.
As miragens que observas todos os dias são feitas para te enganar.
Ilusões de que tudo é belo e perfeito.
Nó fim lá nos encontraremos, cobertos de pó… feitos em cinza.
A verdade esconde-se na eternidade. É um segredo que todos descobriremos.
Continua a vela a arder,
Num esforço brutal, por entre tempestades de vidas presas por um fio.
Sou assim. Vivo por tudo o que dei e por tudo o que esperei, proveniente de desejos inacabados, que sobrevivem no meu interior habitado por demónios que devoram tudo em redor.
Ao redor de mim, ao redor de ti.
Tudo é pó.
Quando a vela se apagar, resta-me a esperança de que permaneço dentro de ti. No calor da tua vela. Que sorrias quando vires a minha miragem. Que grites mudamente, o mais alto que puderes, dentro de ti o meu nome. Que suspires de alívio quando a minha voz te embala enquanto dormes.
Só assim continuarei a arder, por ti…
Dentro de ti sou o ser mais belo que a natureza criou.
Sei, e por isso fico aliviado, que assim serei perpetuado e para sempre mais do que simples cinzas e pó.
Aos que amei e hoje não estão ao pé de mim...
Novembro de 2006

segunda-feira, novembro 06, 2006

Cadáveres ao amanhecer (2ª Parte)

Minutos depois há um som que alerta a equipa. O choro de uma criança ecoa na floresta. Rapidamente todos acorrem ao local. Sobreviventes?
Um rapaz segurava um bebé. Ao ver os homens que correram na sua direcção também ele chorou e gritou.
A expedição partiu sem explicação possível para o que se tinha sucedido. O jovem foi tranquilizado com drogas e partiu também.
Não saía do canto do quarto, ninguém lhe arrancava uma palavra. As roupas que lhe davam para vestir eram rapidamente arrancadas. Houve uma psicóloga que consegui alguma afinidade com o rapaz. Uma jovem licenciada que ali estagiava, também ela de origem índia, foi a primeira a arrancar algumas palavras, ainda que tímidas à criança. «O meu irmão, quero ver o meu irmão! A minha mãe passou-mo para os braços!», disse. O seu irmão estava noutra ala do hospital, mas como se pensava que podia facilitar a relação paciente/terapeuta era-lhe permitido visitar o irmão. Quando chegava perto dele dizia «estamos vivos, conseguimos… nunca te vou deixar!»
Um mês depois dá-se a revelação:
- Tudo começou depois do homem branco lá ter ido. Diziam que queriam falar com o chefe da aldeia. – Disse o rapaz – Chegaram nos seus carros, todos bem vestidos e discutiram com o chefe, Águia Que Dança.
- Que queriam eles? – pergunta a psicóloga.
- Ninguém soube, o chefe apenas disse que a nossa história e os nossos valores pertencem ao todo poderoso e que nunca ninguém iria fazer com que Ele abdicasse deles.
- E as mortes? Tu achas que foi o homem branco?
- Não. – Respondeu secamente.
- Tens a certeza?
- Tenho. Sei quem matou o meu pai e o meu tio Águia Que Caminha.
- Quem? – Perguntou surpreendida a psicóloga.
- Houve um dia que a minha mãe veio ter comigo, levou-me até um sítio na floresta, deu-me o meu irmão e disse «fica aqui, eu vou matar o teu tio porque ele matou o teu pai e agora quer matar-nos a nós», puxou de uma catana e nunca mais a vi… - E acrescentou, - O pajem dizia que era a natureza que nos levava, mas a nossa própria natureza…
Hoje, 30 anos depois, ainda não se sabe o que se passou. Apenas se tem a certeza que as primeiras mortes foram provocadas pelos homens brancos. O instinto selvagem do ser humano, o facto de estarem confinados àquele espaço e a desconfiança fez o resto…
Nunca iremos saber ao certo o que somos quando nascemos, se somos animais naturalmente selvagens e agressivos ou sociáveis e afáveis. Somos apenas o que a sociedade nos impõe. Esta tribo ficou a saber.
Mas quem foram os verdadeiros culpados?
Hoje em dia, no local do aldeamento, encontra-se um complexo turístico.
Mas sem cadáveres ao amanhecer.
Fim?
Novembro de 2006

segunda-feira, outubro 30, 2006

Cadáveres ao amanhecer (1ª parte)

Começaram a aparecer cadáveres por todo o lado. Dia após dia as mutilações tornavam-se cada vez mais macabras. O responsável por todo este rasto de morte parecia estar a entusiasmar-se cada vez mais com o sofrimento das suas vítimas. A cada chaga que infligia dava a sensação de ganhar com isso prazer e motivação para procurar a próxima vítima, ou presa. Os mais anciãos não tinham memória de acontecimentos semelhantes. Dizia a mais velha da aldeia «Deus nos acuda! Vamos todos morrer, não é por mim, ele que poupe pelo menos os meus netinhos! Ai, meu Deus que não há quem nos valha!».
O desespero apoderou-se de famílias inteiras. Há um sentimento de fatalidade presente em todas as faces… em todas as vozes… em todos os olhares. Ninguém conversa com ninguém, por outro lado, podem fazê-lo, mas não como dantes. Já ninguém sabe se conhece o vizinho do lado tão bem como pensava. Com quem estarão a falar? Será a próxima vítima? Ou será(ão) o(s) assassino(s)?
Ao fim de uma semana o cheiro a morte há muito se tornara insuportável. O cemitério cada vez mais cheio e as casas cada vez mais vazias. O medo de sair à rua está instalado, no entanto no dia seguinte lá está, mais uma vez, e outra, outra mais…
O caso tornou-se ainda mais grave quando “Águia Que Dança”, o chefe da aldeia, apareceu completamente desfigurado e trucidado no seu abrigo. “Touro Que Dança”, seu irmão, o melhor e mais forte guerreiro da aldeia, ajoelhou-se junto dele e chorou. Nunca ninguém o tinha visto a chorar. O “pajem” logo disse «se Touro Que Dança chora não temos escape possível, chegámos ao fim…»
Cada amanhecer era cada vez mais tardio e sombrio.
A notícia chegou ao governo central que prontamente enviou uma equipa de antropólogos para o local. Quando chegaram uma aldeã confeccionava uma qualquer espécie de artefacto. Ao avistá-los desatou numa chinfrineira de gritos, pegou numa criança e correu para a floresta. Todos os outros sobreviventes a seguiram. «Esta não foi a melhor estratégia», diziam, «mas porque fugiram de nós? Não é a primeira vez que vêem homens brancos…». Não ficou ninguém para os receber. Nesse mesmo dia, conforme chegaram, partiram.
Passaram a noite na floresta, sem dormir. De manhã estava tudo na mesma e a vida na aldeia voltou à “normalidade”. Vida durante o dia, morte durante a noite, cadáveres ao amanhecer…
Parecia existir um estranho conformismo em todos em relação a esta fatalidade. Os mais novos, devido à sua inocência (ignorância?), pareciam abster-se de tudo isto. Brincavam, uns com os outros nunca sozinhos, sempre sob o olhar atento de “Touro Que Dança”. A sua lança estava mais afiada que nunca e recusava-se a limpar as pinturas de guerra da sua face.
Uma semana mais tarde a equipa de antropólogos voltou. Vinham acompanhados de alguns elementos do exército que, apesar de desarmados, tinham como missão garantir a segurança da expedição. Antes de chegarem o fedor era intenso e os homens tiveram que colocar máscaras. A aldeia está deserta. Alguns animais alimentam-se dos corpos espalhados pelo chão. Foi imediatamente chamado um delegado de saúde. Ninguém se arriscava a entrar mais longe. Quando chegou, o tal delegado de saúde, vomitou após analisar alguns dos corpos. Quando finalmente foram ensacados todos os mutilados deu-se então início à recolha de todas as informações possíveis para desvendar o que se tinha passado. O aldeamento, agora lavado de corpos, está estranhamente calmo. Não se ouve vivalma. Está tudo como se não se tivesse passado nada. As cubatas mantinham-se intactas. Os instrumentos de trabalho estão arrumados e limpos.
Fim da 1ª parte
Continua...

quinta-feira, outubro 19, 2006

March against war

Walks with me side by side,
Keeps me company through the night.
Here we walk giving hands,
Going nowere here we stand.


Causing wars due their pride,
Hungry people find a place to hide.
Bombs exploding ‘cause of god,
Please spare me, I’m just a slob!


Presidents fighting everywhere,
I’ll fight for you, that I swear.
So walk with me let’s stay together,
We’ll find ourselves other place but better,
You are my war…
And I’ll fight forever!


Outubro de 2006

Chiu!...

O silêncio não vale ouro… vale tudo…
Imagina o mundo se vivêssemos em silêncio, calados…
Aquele que outrora foi o teu melhor amigo, provavelmente hoje ainda o seria.
Ainda receberias aquele abraço de cada vez que, euforicamente, te via.
Aquele que amas em segredo ainda te daria a mão quando caminham juntos.
Não ficarias a desejar o seu beijo em certos momentos.
Aqueles que te amaram e to disseram ainda te respeitariam.
E pensas agora como te batia a palavra “amo-te” de cada vez que to diziam.
Aqueles que te respeitam ainda os amarias.
Hoje és pisado e assim será até ao fim dos teus dias.
Por isso esta noite não digas nada, a minha boca vai estar fechada.
Vamos ficar a ver o céu, abraçados, de mão dada…
Quanto te for a sair uma palavra,
Beija-me na boca… e deixa estar tudo como estava.

Outubro de 2006