terça-feira, novembro 28, 2006

O porquê de não escrever...

Não tenho escrito por uma simples razão. Tenho o coração descascado em fatias pequenas por facas enferrujadas. Está aberto um buraco no meu peito infectado pelo qual os anjos me abandonam voando para outros céus escuros a meu olhar, onde pairam nuvens de sentimentos e fadas de olhos vermelhos em chamas que me estrangulam nesta sala negra. Aqui choram-se lágrimas de sangue.
Lentamente desfaleço e entro no coma induzido pela minha inspiração. As melhoras…
Cravam as presas na minha carne, e eu vejo-a flutuar. São pedaços de mim que te levam daqui. Fico eu e o branco laminado do anoitecer dos meus ossos no lusco-fusco. Brevemente (ou não) a carne será reposta. Pouco a pouco. Trazendo de volta a minha inspiração. Até lá…

quarta-feira, novembro 15, 2006

Auto-retrato (sim, sou eu...)

Sombras aos pedaços que outrora formaram um eu riem desalmadamente. Fragmentos de mim que tento recolher para formar um castelo humano. Aqui não faço nada, por isso volto para o meu mundo de desespero onde finalmente dou liberdade à minha morbidez calada. Remeto-me ao silêncio de quem tem tanto para dizer e ninguém a quem o dizer. Compreenderás a minha alma?
Saudades dos vivos, que não vejo hà muito. Não sinto falta dos meus defuntos, vê-los-ei em breve.
Cada vez que adormeço e acordo no dia seguinte apercebo-me que morri durante a noite, mas apenas um pedaço. E então, pedaço após pedaço, após pedaço… durmo. Acordo descansado da morte e cansado da vida.
Farrapos enxovalhados, do bonito lençol que fui outrora, já não bailam ao vento nem brilham ao sol. Num branco escuro carregado de incertezas, em que a única certeza é a dúvida. A dúvida que nos mantém no trilho deste feliz acaso que é a vida. Vida? E depois da vida? E depois de abandonares a embalagem onde te transportas para todo o lado? Espero-te no meu mundo onde dançaremos no baile de surdos. Onde todos vivem na casa assombrada por Deus e por todos os que o julgaram um dia ser. Foi Deus que me criou. Para gáudio próprio. Amamentou-me e fez-me forte. Cresci. E fez-me assim porque são estas as bestas que dão mais gozo abater. Mas são estas as bestas que mais facilmente se viram contra o dono. Quem terá criado Deus? Amar-nos-á ou nutre por nós um ódio visceral?
Abandonei a cruz que carrego e peguei na espada, com a qual disseco e decomponho em troços pequenos tudo dentro de mim e à minha volta. Observo e vivo amores esquizofrénicos com os quais me regozijo. Partidos aos bocados são mais fáceis de engolir. Assim te parto, assim te degusto.
Sem o peso da cruz parto em busca. Procuro-me a mim. Vasculho-me e não me encontro. Grito por socorro, estou cada vez mais perdido. Encontro-te e perdemo-nos juntos. A miséria adora companhia. E eu adoro-te a ti. Sou a tua miséria e tu a minha companhia. Dá-me a mão e vamos juntos conhecer este abismo lindo onde nunca ninguém ousou entrar. Vamos buscar incertezas e dúvidas que a morte esclarecerá em breve. Tudo é oco e fabricado em vão. Em vão vives, fragilmente e docemente, uma vida dura e amarga. Eu não vivo em vão. Tenho uma missão que me foi endossada que ainda estou para descobrir qual é. Senão porque outra razão aqui estaria? Vivendo vaziamente? Há algo aí por fora que me espera senão já teria ido embora há muito tempo. Nem que seja salvar o mundo de mim próprio. E quem me salva a mim de mim próprio? Estarei condenado a esta agonia de viver para sempre comigo? Uma vida de incerteza, de vazio, de ideias levadas na brisa que um dia me atravessou e me esventrou de um sentido claro e pertinente para mim próprio? Brisas vão, brisas vêm. Há-de chegar a brisa que me encha novamente. Já avisto o pó que levanta, ao fundo, no ar. Depois de experimentar a sensação de sufocar ou de ser enterrado vivo por esta tempestade sei que finalmente saberei o ando aqui a fazer, e qual o teu papel no meio disto tudo. Até lá morremos juntos, pedaço após pedaço, após pedaço… até que algo nos separe!

Novembro de 2006

quarta-feira, novembro 08, 2006

Cinzas e pó

Devolvo-me ao sítio de onde vim.
Devolvo-me às cinzas e pó. Sou apenas cinzas e pó.
Arde uma vela que tenta iluminar o cinzento da alma e tudo em redor.
Ao redor de mim, ao redor de ti.
Tudo é pó.
As miragens que observas todos os dias são feitas para te enganar.
Ilusões de que tudo é belo e perfeito.
Nó fim lá nos encontraremos, cobertos de pó… feitos em cinza.
A verdade esconde-se na eternidade. É um segredo que todos descobriremos.
Continua a vela a arder,
Num esforço brutal, por entre tempestades de vidas presas por um fio.
Sou assim. Vivo por tudo o que dei e por tudo o que esperei, proveniente de desejos inacabados, que sobrevivem no meu interior habitado por demónios que devoram tudo em redor.
Ao redor de mim, ao redor de ti.
Tudo é pó.
Quando a vela se apagar, resta-me a esperança de que permaneço dentro de ti. No calor da tua vela. Que sorrias quando vires a minha miragem. Que grites mudamente, o mais alto que puderes, dentro de ti o meu nome. Que suspires de alívio quando a minha voz te embala enquanto dormes.
Só assim continuarei a arder, por ti…
Dentro de ti sou o ser mais belo que a natureza criou.
Sei, e por isso fico aliviado, que assim serei perpetuado e para sempre mais do que simples cinzas e pó.
Aos que amei e hoje não estão ao pé de mim...
Novembro de 2006

segunda-feira, novembro 06, 2006

Cadáveres ao amanhecer (2ª Parte)

Minutos depois há um som que alerta a equipa. O choro de uma criança ecoa na floresta. Rapidamente todos acorrem ao local. Sobreviventes?
Um rapaz segurava um bebé. Ao ver os homens que correram na sua direcção também ele chorou e gritou.
A expedição partiu sem explicação possível para o que se tinha sucedido. O jovem foi tranquilizado com drogas e partiu também.
Não saía do canto do quarto, ninguém lhe arrancava uma palavra. As roupas que lhe davam para vestir eram rapidamente arrancadas. Houve uma psicóloga que consegui alguma afinidade com o rapaz. Uma jovem licenciada que ali estagiava, também ela de origem índia, foi a primeira a arrancar algumas palavras, ainda que tímidas à criança. «O meu irmão, quero ver o meu irmão! A minha mãe passou-mo para os braços!», disse. O seu irmão estava noutra ala do hospital, mas como se pensava que podia facilitar a relação paciente/terapeuta era-lhe permitido visitar o irmão. Quando chegava perto dele dizia «estamos vivos, conseguimos… nunca te vou deixar!»
Um mês depois dá-se a revelação:
- Tudo começou depois do homem branco lá ter ido. Diziam que queriam falar com o chefe da aldeia. – Disse o rapaz – Chegaram nos seus carros, todos bem vestidos e discutiram com o chefe, Águia Que Dança.
- Que queriam eles? – pergunta a psicóloga.
- Ninguém soube, o chefe apenas disse que a nossa história e os nossos valores pertencem ao todo poderoso e que nunca ninguém iria fazer com que Ele abdicasse deles.
- E as mortes? Tu achas que foi o homem branco?
- Não. – Respondeu secamente.
- Tens a certeza?
- Tenho. Sei quem matou o meu pai e o meu tio Águia Que Caminha.
- Quem? – Perguntou surpreendida a psicóloga.
- Houve um dia que a minha mãe veio ter comigo, levou-me até um sítio na floresta, deu-me o meu irmão e disse «fica aqui, eu vou matar o teu tio porque ele matou o teu pai e agora quer matar-nos a nós», puxou de uma catana e nunca mais a vi… - E acrescentou, - O pajem dizia que era a natureza que nos levava, mas a nossa própria natureza…
Hoje, 30 anos depois, ainda não se sabe o que se passou. Apenas se tem a certeza que as primeiras mortes foram provocadas pelos homens brancos. O instinto selvagem do ser humano, o facto de estarem confinados àquele espaço e a desconfiança fez o resto…
Nunca iremos saber ao certo o que somos quando nascemos, se somos animais naturalmente selvagens e agressivos ou sociáveis e afáveis. Somos apenas o que a sociedade nos impõe. Esta tribo ficou a saber.
Mas quem foram os verdadeiros culpados?
Hoje em dia, no local do aldeamento, encontra-se um complexo turístico.
Mas sem cadáveres ao amanhecer.
Fim?
Novembro de 2006

segunda-feira, outubro 30, 2006

Cadáveres ao amanhecer (1ª parte)

Começaram a aparecer cadáveres por todo o lado. Dia após dia as mutilações tornavam-se cada vez mais macabras. O responsável por todo este rasto de morte parecia estar a entusiasmar-se cada vez mais com o sofrimento das suas vítimas. A cada chaga que infligia dava a sensação de ganhar com isso prazer e motivação para procurar a próxima vítima, ou presa. Os mais anciãos não tinham memória de acontecimentos semelhantes. Dizia a mais velha da aldeia «Deus nos acuda! Vamos todos morrer, não é por mim, ele que poupe pelo menos os meus netinhos! Ai, meu Deus que não há quem nos valha!».
O desespero apoderou-se de famílias inteiras. Há um sentimento de fatalidade presente em todas as faces… em todas as vozes… em todos os olhares. Ninguém conversa com ninguém, por outro lado, podem fazê-lo, mas não como dantes. Já ninguém sabe se conhece o vizinho do lado tão bem como pensava. Com quem estarão a falar? Será a próxima vítima? Ou será(ão) o(s) assassino(s)?
Ao fim de uma semana o cheiro a morte há muito se tornara insuportável. O cemitério cada vez mais cheio e as casas cada vez mais vazias. O medo de sair à rua está instalado, no entanto no dia seguinte lá está, mais uma vez, e outra, outra mais…
O caso tornou-se ainda mais grave quando “Águia Que Dança”, o chefe da aldeia, apareceu completamente desfigurado e trucidado no seu abrigo. “Touro Que Dança”, seu irmão, o melhor e mais forte guerreiro da aldeia, ajoelhou-se junto dele e chorou. Nunca ninguém o tinha visto a chorar. O “pajem” logo disse «se Touro Que Dança chora não temos escape possível, chegámos ao fim…»
Cada amanhecer era cada vez mais tardio e sombrio.
A notícia chegou ao governo central que prontamente enviou uma equipa de antropólogos para o local. Quando chegaram uma aldeã confeccionava uma qualquer espécie de artefacto. Ao avistá-los desatou numa chinfrineira de gritos, pegou numa criança e correu para a floresta. Todos os outros sobreviventes a seguiram. «Esta não foi a melhor estratégia», diziam, «mas porque fugiram de nós? Não é a primeira vez que vêem homens brancos…». Não ficou ninguém para os receber. Nesse mesmo dia, conforme chegaram, partiram.
Passaram a noite na floresta, sem dormir. De manhã estava tudo na mesma e a vida na aldeia voltou à “normalidade”. Vida durante o dia, morte durante a noite, cadáveres ao amanhecer…
Parecia existir um estranho conformismo em todos em relação a esta fatalidade. Os mais novos, devido à sua inocência (ignorância?), pareciam abster-se de tudo isto. Brincavam, uns com os outros nunca sozinhos, sempre sob o olhar atento de “Touro Que Dança”. A sua lança estava mais afiada que nunca e recusava-se a limpar as pinturas de guerra da sua face.
Uma semana mais tarde a equipa de antropólogos voltou. Vinham acompanhados de alguns elementos do exército que, apesar de desarmados, tinham como missão garantir a segurança da expedição. Antes de chegarem o fedor era intenso e os homens tiveram que colocar máscaras. A aldeia está deserta. Alguns animais alimentam-se dos corpos espalhados pelo chão. Foi imediatamente chamado um delegado de saúde. Ninguém se arriscava a entrar mais longe. Quando chegou, o tal delegado de saúde, vomitou após analisar alguns dos corpos. Quando finalmente foram ensacados todos os mutilados deu-se então início à recolha de todas as informações possíveis para desvendar o que se tinha passado. O aldeamento, agora lavado de corpos, está estranhamente calmo. Não se ouve vivalma. Está tudo como se não se tivesse passado nada. As cubatas mantinham-se intactas. Os instrumentos de trabalho estão arrumados e limpos.
Fim da 1ª parte
Continua...

quinta-feira, outubro 19, 2006

March against war

Walks with me side by side,
Keeps me company through the night.
Here we walk giving hands,
Going nowere here we stand.


Causing wars due their pride,
Hungry people find a place to hide.
Bombs exploding ‘cause of god,
Please spare me, I’m just a slob!


Presidents fighting everywhere,
I’ll fight for you, that I swear.
So walk with me let’s stay together,
We’ll find ourselves other place but better,
You are my war…
And I’ll fight forever!


Outubro de 2006

Chiu!...

O silêncio não vale ouro… vale tudo…
Imagina o mundo se vivêssemos em silêncio, calados…
Aquele que outrora foi o teu melhor amigo, provavelmente hoje ainda o seria.
Ainda receberias aquele abraço de cada vez que, euforicamente, te via.
Aquele que amas em segredo ainda te daria a mão quando caminham juntos.
Não ficarias a desejar o seu beijo em certos momentos.
Aqueles que te amaram e to disseram ainda te respeitariam.
E pensas agora como te batia a palavra “amo-te” de cada vez que to diziam.
Aqueles que te respeitam ainda os amarias.
Hoje és pisado e assim será até ao fim dos teus dias.
Por isso esta noite não digas nada, a minha boca vai estar fechada.
Vamos ficar a ver o céu, abraçados, de mão dada…
Quanto te for a sair uma palavra,
Beija-me na boca… e deixa estar tudo como estava.

Outubro de 2006

segunda-feira, outubro 16, 2006

Anjos e Demónios (parte 2)

Demónios
Não, não nada é teu,
Tua mulher, teu carro é tudo meu.
Vendo-te o sonho como um sentido,
Tu serves-me, que de nada sirvo.
Prisioneiro a tempo inteiro,
Pensas em Deus, Deus já te esqueceu.
Agora és todo meu, todo meu!

Não, não! Não tenho tempo
Para ouvir o teu lamento.
Quando parasitas fazem o que quer,
Fico logo quente e os teus enterro.
Enfraquecido e embrutecido,
Pensas em Deus, Deus já tudo deu!
Agora és todo meu, todo meu!

E o diabo dança
Já não tem importância!
Já não tem esperança!
E o diabo em nome da tua raça
Diz-me o que é que se passa,
Já não tem importância…
"O diabo dança" - Fora de mão
Outubro de 2006

Anjos e Demónios (parte 1)

Anjos

Há algo que me toca…
Percorre-me e deixa-me paralisado com o seu perfume.
Não há mito urbano que o explique, nem enciclopédia onde esteja presente.
Algo que apesar de pequeno me protege no calor das suas asas e me eleva aos reinos dos céus onde, aí, finalmente me encontro e explico.
Há uma música sem instrumentos a ser tocada, ao som da qual danço seduzido por este anjo.
Abstenho-me das guerras dentro e fora de mim que normalmente controlam a minha vida. Afugenta os demónios que me devoram e cravam as suas garras cada vez mais fundo na minha carne. Embrenho-me em sonhos de ternura e escondo-me atrás das suas asas para assim evitar ser acordado.
Tento escrever o que sinto mas não tenho vocabulário para o fazer, com muita pena minha porque era algo que gostava de revelar. Faz-me desejar ser um príncepe encantado, mas o meu cavalo é negro a teus olhos.
Sinto-me minúsculo ao pé da grandeza que apresenta, o que se torna um obstáculo nas danças a que nos entregamos.
Quando finalmente acordo, o sonho caminha a meu lado, nos sons… nos cheiros… no olhar… na memória.
Guardo a bailarina e fecho a caixa de música que me embala.
Apercebo-me que sonhei com algo que nunca tive, nem tenho, e que ainda assim morro de medo de o perder! O que és afinal? Não sei, mas adorava saber…
Outubro de 2006

quarta-feira, outubro 04, 2006

Depois daquela noite...

«As almas são, na vida como na morte, iguais. São livres de serem o que querem. Escolhem, seguem e vivem os seus caminhos livremente. A única diferença é que na morte essas escolhas são espelhadas de forma perfeita, tal qual tu as vês, como me vês. Tu vês o que eu quero que tu vejas porque eu assim me defini. Como se estivesses num sonho. Quando sonhas é a tua alma no seu momento mais puro a querer libertar-se e a viver por si só, não podes fazer nada para o evitar, não a consegues controlar, não há regras...»
Ricardo Mouro num devaneio em que deixou de ouvir o professor...

segunda-feira, setembro 25, 2006

Telepatia (3º e último acto)

Act tree
De facto, todo o mundo o ficou a conhecer. “O homem que preferiu saltar pela janela”, preferindo esse destino ao de morrer abraçado pelas chamas. O seu último pensamento foi o de pedir desculpa a Tim, por o ter abandonado desta maneira mas dadas as circunstâncias achou esta a decisão mais acertada.
O homem mais corajoso do mundo… Do mundo! Ninguém sabe o teu nome mas todos se prostram perante a tua coragem, és falado e relembrado e permaneces em sonhos e pesadelos de milhões de pessoas… Realizaste o teu sonho, nunca mais serás ignorado.
Nos dias seguintes, nos destroços, inúmeras equipas de busca procuravam sobreviventes. Vários agentes da autoridade estavam acompanhados de cães especialmente treinados para estas situações. No entanto, ao fim de muitas horas de sacrifício por parte de todos os implicados neste esforço, alguém reparou num certo cão que escava, ao som de latidos e gemidos ofegantes, por todos os destroços. De onde teria vindo e porque estaria ali? Toda a gente ficou estupefacta e comovida com esta atitude. Um cão, aparentemente vadio, entregava-se às escavações juntamente com as outras centenas de pessoas e animais que ali estavam. Tim parecia saber que o seu irmão estaria algures por ali. O pobre animal só parou quando tinhas as patas em ferida e não conseguia mais andar. As saudades do seu irmão causavam mais sofrimento do que qualquer dor física. A comovente história deste animal fez com que recebesse tratamento junto das equipas de socorro e houve muita gente que se voluntariou para adoptarem o “bicho”. Uma senhora de posição respeitável numa comunidade local, propôs que Tim fosse levado para uma instituição que ela dirigia para ser a mascote. Ela pensou que a força de vontade e a história de Tim seria um bom exemplo para as crianças. Especialmente para uma, que não parava de chorar desde que vira estes acontecimentos na televisão. Talvez ela precisasse de esperança. Quando Tim chegou à instituição dirigiu-se de imediato à criança que soluçava encharcada em lágrimas e num gesto de amizade lambeu-lhe a cara. A criança aparentava ter cerca de 4 anos e ser extremamente saudável, só que já não falava à três dias, desde que vira as imagens. Porém quando Tim o lambeu, virou-se para ele e disse:
«Olá! Estava à tua espera... O meu nome é Patrick, e o teu? Sonhei que vinhas ter comigo.»
Tim pousou a cabeça no colo da criança e esta sorriu.
Tim viria a falecer dias depois, não se sabe porquê. Tristeza? Depressão?
Ou alguém como que por telepatia lhe disse doutro mundo para ir ter com ele? Descansem em paz.
A criança, órfã de pai e mãe, nunca mais chorou.
The end

sexta-feira, setembro 22, 2006

Telepatia (2º acto)

Act two
Uma manhã houve que Tim não se levantou para lhe dar os bons dias. Estranho… foi ter com ele e Tim parecia doente e melancólico, emitia alguns gemidos mas que não pareciam vir de qualquer dor física. É a primeira vez que o vê assim. De cada vez que se preparava para sair de casa em direcção ao trabalho Tim parecia intensificar os seus gemidos. Mas teve que sair na mesma ou o italiano despedia-o e iria ser extremamente difícil tentar iludir outro patrão sobre a condição de ser seropositivo. De qualquer das formas iria vê-lo de novo quando chegasse.
Chegado ao trabalho o italiano gritou-lhe que não tolerava mais atrasos e que se estava pouco lixando para se o cão estivesse doente. Tinha uma entrega para fazer de 5 pizzas que lhe sairiam do bolso se chegasse atrasada. Era num 62º andar de um edifício bem conhecido. Seria brincadeira? Geralmente era alvo de partidas de gente mal-educada e sem nada melhor para fazer. E a hora, pouco depois das 9 da manhã parecia denunciar isso.
Chegado ao local, e após subir os andares de elevador, confirmou que não era brincadeira. Uma senhora tinha confirmado que estava grávida e ela e as colegas preparavam-se para festejar. Estavam eufóricas!
Mas poucos minutos depois, enquanto esperava pelo pagamento, o impensável acontece. Um estrondo ensurdecedor abana todo o edifício, foi como uma bomba a explodir e a ameaçar ruir toda a estrutura. A alegria transformou-se num cenário dantesco. Veio a saber-se que um avião desgovernado tinha-se despenhado contra o enorme prédio. Que teria provocado isto? Para piorar as coisas os elevadores ficaram unitilizados e os andares por baixo completamente destruídos. Não tinham como sair. Como poderia acontecer uma coisa destas? As chamas começaram a invadir os restantes andares. Encontrava-se numa prisão de fogo, habitada por pânico, lágrimas e gritos. Mulheres abraçadas em choros de desespero como quem vê a vida a ser consumida por chamas que devoram tudo em redor. Mas ele pensou, «esta é a minha hipótese, vou ser famoso em todo o mundo, hoje dia 11 de Setembro toda a gente vai ficar a saber quem sou, o homem mais corajoso do mundo»! Preparava-se para realizar o seu sonho. O que pode passar pela cabeça de um homem neste momento? Sem ser o pânico misturado numa vil aliança com o fumo a roubar-nos o oxigénio?

End of act two
To be continued…

(suspiro)...

O que seria da tua vida sem o teu olhar a iluminar-me?
Como seriam os meus dias sem o ardor da tua alma?
Porquê caminhar pelas trevas à procura da dor… se hoje posso encontrá-la no declínio do teu abismo
Uma flor... é mórbida?, porém delicada e deslumbrante é um fruto negro e proibido, lança no meu peito ferido ondas que tocam nas nuvens e inundam o infinito
Um castelo de espelhos na areia do meu tempo
O sangue quente derramado das veias do desespero
A escuridão é nobre, devora as estrelas
É o frio do coração que congela a minha tristeza
Vivo pela morte… numa sede vampírica
Sou as páginas do livro macabro e místico
Reflicto no teu ego a imagem mais nítida do alquimista à procura da amarga utopia, sinto o calor dos teus lábios
Vejo a lua através dos teus olhos
Sigo pregada na tua cruz, ferida pelos espinhos do amor envelheço mil anos por segundo…
São as asas que ardem em chamas e me levam ao vale da solidão onde encontro o meu abrigo desejado em tal sentido sem razão
Pois, tu és a canção lírica que reluz a minha alma negra
O teu sentimento obscuro é a minha felicidade mórbida
Preciso dizer que te amo…

Abril de 2005
Obrigado por teres partilhado o teu pensamento comigo. Autora Anónima

sexta-feira, setembro 15, 2006

Telepatia (1º capítulo)

Acorda embrutecido pelo sol que entra pelas persianas e é violentamente sugado para fora da cama. A vida nunca o favoreceu, vive bum subúrbio qualquer de uma grande cidade. Empurrado pela vergonha dos cidadãos para fora das suas fronteiras... e da sua vista. Ao aproximar-se da janela contempla a visão da auto estrada completamente lotada de impacientes e mal-humorados. Quem vem dar-lhe os bons dias é o fiel Tim. Conheceu-o quando uma trip de cocaína mais forte o empurrou para uma valeta e aí o deixou entregue à intempérie, até que um cachorro de destino semelhante lhe recuperou os sentidos e por ali ficaram, juntos, utilizando o calor corporal um do outro numa tentativa fútil de aquecerem. Quando pela manhã foram acordados pelos homens do lixo, deixou-se levar por Tim até à casa de chapas de alumínio e contraplacados onde ainda hoje vivem. Apesar de tudo este homem é feito de sonhos. Sonha ser conhecido por todo o mundo, (ou apenas a cidade que o ignora), e que alguém na sua situação também pode ser reconhecido pelas melhores razões. Faz pela vida a entregar pizzas num pequeno restaurante de cozinha italiana gerido por um imigrante italiano que ali o explora e às próprias filhas.
Toma o pequeno almoço juntamente com Tim. Restos de uma "4 estações" que conseguiu desviar da atenção do italiano. Este momento matinal é o momento de união entre dois eternos amigos que nunca conheceram outra família e que se conhecem como se uma telepatia os ligasse mesmo quando estão longe um do outro. Tim tem a cabeça pousada no colo, não de um seu dono mas de um seu irmão. A mãe de Tim foi atropelada na auto estrada que se vislumbra da janela, e o seu irmão a única família que conheceu foi uma rapariga que antes de morrer de SIDA lhe disse que ele tinha sido pai de uma criança que fora entregue a uma instituição e que se chamava Patrick. Ficou chocado, nunca tinha entrado num hospital e, quando ao visitar a única pessoa que se tinha preocupado minimamente com ele a definhar devido a uma doença, ficou, de uma vez só, a saber que tinha sido pai e que tinha SIDA. Voltou para a rua nesse dia e comprou uma dose de droga muito má, que o levou a um estado onde acabaria por encontrar Tim.
End of act one
To be continued...

quinta-feira, agosto 31, 2006

Sentimento

Não sei o que sinto…
Por vezes uma agonia que me revolta,
capaz de me deitar por terra.
Ligo a televisão e surpreendo-me.
Começou mais uma guerra.
Outras vezes um ódio que me sufoca,
capaz de me fazer explodir.
Os ricos cada vez mais ricos,
e cada vez mais crianças na rua a pedir.

Não sei o que sinto…
Por vezes uma solidão que me deixa inerte,
capaz de me por a escrever,
a desejar uma noite inteira
o momento em que te vou conhecer.
Outras vezes uma violência que por mim sobe,
capaz de me fazer sofrer.
Mas basta apenas um leve olhar nos teus olhos,
para me redobrar a vontade de viver.

Não sei o que sinto…
Por vezes que a vida me persegue,
que tudo de mal que me acontece é um aviso.
Mas depois estou contigo,
e apercebo-me que tu és tudo o que preciso!
A vida faz mais sentido,
o sol brilha com mais intensidade,
o luar é mais romântico…
E os momentos passados sem ti são invadidos pela saudade!

Abril de 2006

Amor e Ódio

Por ti vivo no planeta dos sonhos, cercado pela utopia de uma magia que me libertará e me deixará ir longe neste mar nocturno e espelhado.
Embalado pela esperança de que sobrevivo em teu pensamento, alimentado por uma paixão que tem a capacidade de me deixar morrer à fome.
Sinto um perfume que me desperta sensações de tortura e deixo-me invadir pelo prazer de vaguear por entre as ruas desta cidade que nunca dorme, perseguindo o rasto que emanas. Sigo o desejo de que sejas real, para além dos pesadelos e insónias que me provocas, por seres o ser mais belo que já imaginei.
Não és real… não podes… é impossível…! Tenho a certeza que nunca me darias a hipótese de te amar. És apenas o fruto da minha embriaguez mental que tenta procurar um refúgio para ela própria.
Serei hipócrita, ou apenas sonhador?
Que procuro eu? A ti?
Não pode ser verdade, se fui eu te criei, para sofrimento próprio!
Tens que me ajudar, pega na tua arma, que és tu, e decide!
Dá-me a tua mão ou corta a minha!
Corre comigo por entre esta cidade ou rasteira-me, e ri-te de mim a plenos pulmões enquanto eu injustamente caio na humilhação de um dia sequer te ter amado sem o mereceres!
Será crime amar sem ser amado? O castigo é pior do que para alguém que provoca uma guerra e mata milhares de inocentes… Inocentes que, de certeza, também amaram… Mas, e quantos foram amados? Diz-me o que sentes dir-te-ei o quanto sofres!
Atinge-me o coração dos sentidos como uma orquestra de espingardas automáticas e o poder de fogo da 9ª sinfonia, e põe-me a pensar:
Sem ti o que é que eu faria?
Nem amava, nem sofria…

Abril de 2006
Um dia senti-me assim...
O texto que viria a ser o responsável pelo nome do blog.

Tudo o que quero

Dá-me o sol, dá-me a lua, dá-me as estrelas...
Dá-me o romantismo de um jantar à luz das velas!
Dá-me uma duna, uma praia, todo o mar...
Dá-me os céus e o poder de voar!
Dá-me cordilheiras inteiras e grutas sem fundo,
Dá-me as sete maravilhas do mundo!!
Dá-me o quiseres, não quero nada.
Quero-te a ti, junto a mim, sentada...
Quero os teus lábios junto aos meus,
Quero tocar o teu corpo desenhado por Deus!
Quero sentir no meu corpo o teu perfume
E as tuas mãos que me tocam como lume.
Quero beijar toda a tua pele,
E poder sentir o teu sabor a mel!


Dá-me todo o mundo e a sua natureza,
Mas nada, nunca,
Nada se comparará à tua beleza!

Janeiro de 2006


Dedicado a quem me inspirou e ao amor que nunca existiu entre nós. Este poema és tu e é todo teu. A ti te agradeço...

O Crime

Corre o sangue pelo chão,
Ao qual se juntam lágrimas derramadas em vão.
Desta ferida aberta que nunca fecha
No corpo do homem que te deseja.


Perde a força a cada gota que cai
E a vontade de viver a cada lágrima que sai.
Cada passo na tua direcção é dado em falso,
Toda esta viagem que percorre é um percalço.


Pobre homem este, miserável a sua sorte,
Abandonado e à mercê da morte.
Culpado no crime de te amar
Castigaste-o com uma ferida que nunca há-de sarar.


Vem a morte como escape
Sem qualquer hipótese de resgate
E liberta a sua alma do sofrimento,
Dando-lhe o paraíso em cada momento.

Abril de 2006

O Grito

A imponência de um grito mudo, saído de uma mãe com fome, traz-me à memória momentos vários e distantes. Aqueles em que viver era uma obrigação e alguém era dono dos nossos destinos. Momentos que vivem milhões de anónimos, cujo único erro foi nascer e ter uma mãe muda de fome que nunca os abandonou.
Grito caído no escuro do abismo, não deixes de mostrar o teu sofrimento! Eu vivo no abismo e estou lá para te ouvir, contigo sofro e abraço-te no meu peito. Mostro-te que sou diferente dos que te chicoteiam e te exploram! Não te quero levar as filhas, não quero o teu trabalho, não quero a tua vida… Quero limpar-te as lágrimas e pegar a tua mão. Quero levar-te numa viagem e mostrar-te um mundo com justiça e igualdade, aquele em que tens o direito de sonhar.
Quero levar-te a todo lado e mostrar que existes, àqueles que mais te ignoram mas ao mesmo tempo mais te provocam! Porquê? Quanta ignorância prevalece no seio deste milagre que é a vida… E as injustiças neste milagre que vezes demais nos leva ao desespero… Milagre?! Imploro por um milagre que venha alterar tudo isto! Não precisa de ser um milagre, basta uma atitude. Uma atitude que desvenda o que está por detrás da burkha. Ou que mostre o que está para além da lâmina que excisa e do suor de uma criança.
Quantos pobres precisas para seres rico?
São sempre os mais fracos e pobres que mais sofrem, é o castigo de serem miseráveis, de uma vida a trabalhar. Porque é que quem nunca teve nada tem de acabar da mesma forma? São uns tristes! Pois, são tristes porque existem os outros que são felizes e provocam esta distinção. Quantos gritos mudos mais iremos ouvir? Os mesmos que ouvimos até agora, fingimo-nos de surdos!


Abril de 2006

O que somos nós?

O que somos nós?

O que somos nós?!
Imagina um casal que gera um filho, cria-o, educa-o e passa sacrifícios vários para fazer dele um homem. O que fazem apenas é adiar-lhe a hora da morte. Ninguém escapa a essa sorte porque nós não somos nada!

Uma criança que passa fome, uma mãe que não dorme…
Uma criança que adoece, uma mãe que reza a sua prece…
Uma criança que morre… uma vida perdida, uma mãe ressentida, incapaz de trazer nova luz e brilho aos olhos do seu rebento, condenado a uma vida de tormento. Nenhum pai deve enterrar os seus descendentes. Mas quando a vida é injusta, amarra-nos com correntes, com unhas e dentes. Que pode um pai fazer? Nada, porque nós não somos nada.

A riqueza injustamente espalhada pelo mundo, guerras que vão fazer o humano bater no fundo e levar-nos à extinção. A incapacidade dos líderes em pedir perdão, leva os inocentes a batalhas confusas e sem precedentes. O problema da guerra que prolifera no planeta terra, é o resultado da ganância de personalidades sem importância em busca de relevância. Deixam um rasto de viúvas e órfãos. E sangue nas suas mãos, assassinos! E tudo isto porquê? Nós não somos nada.

Sempre que um manifestante é espancado, um mero transeunte apunhalado, um homem roubado e um casal de idosos burlado, a morte sorri-nos com um carinho especial. Sorri-lhe de volta, pois neste mundo social ela está em todos os cantos, esperando-nos com epidemias e cancros. Não lhe podes fugir, quando ela estiver para vir, já sabes, só te resta sorrir.

Mas há coisas que não têm explicação e muitas outras para além da razão. Diz-me tu, do interior da tua sabedoria sem fim:
Se nós não somos nada, porque é que tu és tudo para mim?

Agosto de 2005